Compreender o processo de mobilização de saberes
nas práticas dos professores constitui num desafio instigante, principalmente
porque toma conceitos de habitus e saberes,
considerando-os em sua interação.
A idéia de habitus permite se
pensar no ser humano como alguém com capacidade permanente de transformação,
não apenas nos aspectos físicos, mas principalmente em relação aos seus
julgamentos e deliberações, modos de se comportar e de se posicionar diante das
situações cotidianas que também são mutáveis. Este entendimento possibilita analisar
professores, sob o ponto de vista de um processo dinâmico de interação sujeito-meio,
em que ora ocorrem momentos de constância de condutas e pensamentos, ora estes
mesmos momentos se modificam gerando outras compreensões, outros procedimentos,
outras relações. É possível a compreensão de que os saberes mobilizados pelos
professores decorrem de sua formação inicial e continuada, assim como das
situações que permeiam o cotidiano da sala de aula, ou seja, o trabalho com os
conhecimentos, o atendimento aos alunos, as propostas de atividades, a
organização das condutas disciplinares da turma. Entretanto, o diferencial do
processo de mobilização de saberes de cada professor se origina no modo como
cada um demonstra seu modo de pensar e de se comportar – seu habitus –,
constituído ao longo de sua trajetória de vida pessoal e profissional.
A partir destes referenciais, as contribuições podem
ser assim apresentadas:
- Provocar a reflexão sobre os aspectos
constitutivos do habitus professoral dos professores, gerando
elementos impulsionadores de debates entre os formadores e entre os próprios
docentes, que tornem possível um aperfeiçoamento, uma qualificação do trabalho
nesta modalidade de ensino.
- Constatar o fato de que durante o processo de
mobilização de saberes, ao efetivar a prática pedagógica, o professor se ampara
principalmente nos saberes disciplinares construídos no seu
tempo de vivência da escola como estudante, ou seja, o professor explica os
conteúdos do currículo rememorando o modo como aprendeu em seu tempo de escola,
a fim de sistematizar os saberes curriculares que são
priorizados na instituição escolar. Isto faz com que a preponderância da
utilização desaberes disciplinares e curriculares seja destacada em
sua atuação profissional em relação ao uso dos demais saberes que possui. Esse
aspecto deveria ser considerado nos cursos de formação de professores, a fim de
prepará-los para vencerem a superficialidade que na maioria das vezes se faz
presente no trabalho com os conhecimentos ou evitar o apego em áreas com as
quais se identificam mais.
- Destacar que o profissional, se comparado aos
professores dos anos finais e/ou Ensino Médio, mantém mais horas em contato com
o mesmo grupo de alunos 4 horas diárias , que fazem com que disponha de tempo
para criar uma afinidade maior em seu ambiente de trabalho, conhecer mais de
perto as particularidades daquele espaço de atuação, envolver-se com mais
comprometimento. Os outros professores fragmentam este mesmo tempo entre as
diversas turmas em intervalos rápidos nestas trocas, ficando sempre
prejudicados na construção de uma visão mais totalizante de seu local de
trabalho.
- Apontar que o processo de mobilização de saberes
do professor tem estreita relação com a formação inicial vivenciada. Uma graduação
em Pedagogia propicia um melhor domínio no trabalho desenvolvido e a
possibilidade de encadeamento da teoria com a prática.
- Resgatar o valor do planejamento diário como um
roteiro e referencial organizador, do modo como o professor pensa e age e de
suas intenções durante a relação ensino e aprendizagem, propiciador de um
processo reflexivo sobre a própria prática e de interações com os colegas de
profissão.
- Mostrar que o professor, ao efetivar a docência,
passa a expor os traços de seu processo de socialização. Revela sua origem
social e cultural. Situação que se evidencia entre os professores, aos quais
tem aspectos muito semelhantes em suas histórias de vida, entre eles:
pertencerem a famílias de baixa renda, moradores da zona rural, necessitarem
vir para a cidade para estudar e buscar um futuro melhor, iniciarem o exercício
da profissão sem passar pela formação específica, o gosto pelo ofício e sua
consolidação através do curso de graduação. Estes aspectos permeiam o modo como
expressam suas opiniões, interagem com suas turmas e com colegas, assim como na
organização de suas propostas diárias de trabalho.
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